segunda-feira, 14 de julho de 2014

SOBRE A DECISÃO DO RECURSO DE APELAÇÃO DA CASA DA CRIANÇA DO BRASIL


Aconteceu no dia 26/06/2014  o julgamento pela 5ª Câmara de Direito Civil do TJSC, do RECURSO DE APELAÇÃO  que eu e a Casa da Criança do Brasil interpusemos contra a decisão que a juíza Bertha Rezende proferiu no processo 005080528XX-X, que tratou de DUAS DENÚNCIAS do MPSC  sobre fatos que alegaram teriam ocorrido em 2007/2008.
O fato 1 se referiu a uma publicação que postei no site do meu escritório, lá no ano de 2008, na íntegra, de um ofício que enviei à Câmara de Vereadores de BC, naquela época, oferecendo aos Vereadores algumas informações que considerava úteis, porque a Associação Passos de Integração pretendia a aprovação de uma lei PARA RECEBER DINHEIRO PÚBLICO para realizar o programa PAF [programa de apoio familiar].

A  Juíza S. M., madrinha daquela Associação e o Promotor de Justiça R. D. fizeram ‘looby’ junto aos vereadores para convencê-los a aprovar o tal projeto. Eu fiz  “lobby” contra a aprovação, isto porque, simultaneamente a esse pedido  aquela equipe do PAF/ PASF, especialmente na pessoa da psicóloga J. de S. E., agia no sentido de tirar dos pais biológicos P. e R. as crianças G., K. e B.,  favorecendo um casal - M. A. e M. B. - que pretendia a adoção somente da criança G.
Em 14.02.2006 aquela Juíza,  juntamente com aquele Promotor de Justiça editaram a portaria nº 03/2006 dispondo  “sobre o abrigamento de crianças e adolescentes na Comarca de Balneário Camboriú”, considerando, entre outras razões, a implantação do programa FAMÍLIA ACOLHEDORA que seria executado nesta Comarca pela ONG Associação Passos de Integração.

A proposta e o formato do programa “Família Acolhedora” não deu certo  - dezenas foram os problemas especialmente quando a família acolhedora se encantava com a criança, no mais das vezes de tenra idade e queria “adotá-la”.
Tanto o programa família acolhedora quanto o programa de acolhimento familiar buscavam verba pública para custear técnicos que deveriam se dedicar a acolher e apoiar as crianças e suas famílias [na sua quase totalidade pobres], mas se transformou em um sistema extrajudicial que decidia – conforme a simpatia ou antipatia da assistente social e/ou psicólogo – pela destituição do poder familiar de pais pobres sobre seus filhos e nada fazia para ajudar aquela família a reequilibrar-se e manter consigo os filhos, norte do ordenamento Constitucional vigente[1].

Assim, uma considerável soma de dinheiro público estava sendo disponibilizada para uma ONG custear a remuneração de três psicólogas, duas assistentes sociais, um pedagogo, um coordenador administrativo e número não definido de estagiários para “atender”, “fortalecer” e “prevenir” a família ...  até que “Caso a família não corresponda ao trabalho, ver perspectivas de encaminhamento aos programas competentes para a inclusão em família substituta ou outras medidas cabíveis”. Assim previa a Portaria 03/2006.
Afirmo que o programa servia mais ao poder judiciário - que é obrigado a resolver a situação de crianças em abrigo -, do que às famílias e/ou crianças ,  porque a CASA DA CRIANÇA abrigou, naquela mesma época, aquelas crianças G., K. e B. filhos de P. e R. A respeito desse caso a Assistente Social forense A. B. relatou nos autos de verificação de situação de risco nº 005.04.0138XX-X que era “evidente o zelo e atenção da Sra. R. a todos os filhos, dando mostras de uma maternidade responsável. Necessita sim, de auxílio dos serviços públicos, para melhor cuidar de seus filhos.”  (fls. 30).

Na audiência realizada nesse processo em 21.05.2007 a mãe R.  relatou à Juíza S. M. que “sofreu constrangimento por parte de J. de S. E.”, então psicóloga do PAF e pessoa da confiança da Magistrada. Mesmo assim tiraram os filhos de R.!
A equipe do PROGRAMA FAMÍLIA ACOLHEDORA [ou Acolhimento Familiar] manifestou-se naquele processo, em petição com timbre da ONG Associação Passos de Integração (fls. 70) sugerindo que a criança G. fosse encaminhada para a família de “M.  A. B. e seu marido M. B.”. Aquela equipe era paga com dinheiro público para apoiar a família de origem da criança [entenda-se auxiliar para que ela se reorganizasse]. No entanto, tirava as crianças dos pais pobres, alguns miseráveis, e dava-as em “adoção”.

Há uma simpatia espontânea com quem deseja adotar, simultaneamente a uma rejeição instantânea com mães e pais pobres. Àqueles por que são vistos como pessoas especiais [porque estão adotando] e estes como pessoas desprezíveis [porque não souberam cuidar dos próprios filhos]. Os primeiros a fazer esse julgamento são os conselheiros tutelares, em seguida as assistentes sociais. E são as assistentes sociais que fazem relatórios para os juízes. E são os conselheiros tutelares que são ouvidos pelo juiz. Nesses relatórios e nessas falas eles passam o juízo de valor que antecipadamente fizeram, tanto em relação a quem adota [sempre positivo] quanto em relação aos pais e mães “incompetentes” que não souberam cuidar dos filhos [normalmente negativo].
O caso daquela família remonta ao ano de 2004 quando a Conselheira Tutelar V. F. comunicou ao Ministério Público a situação em que se encontravam. Somente em 2007 agilizaram o caso e ainda para tirar os filhos daquela mãe, porque havia uma pessoa considerada “do bem” pela equipe do programa PAF para dá-las em adoção. Era o casal M. A. B. e M. B. Ninguém se pergunta por que aquela família ficou desassistida de 2004 a 2007? E por que em um ano [2007] as crianças foram tiradas da família e colocadas em família substituta?

Por todas essas razões me opus a aprovação daquele projeto de lei, apenas exercendo minha cidadania em defesa de pessoas que eram e são sistematicamente desconsideradas por alguns representantes dos poderes públicos.
Esse processo de P. e R. foi uma das maiores violações a direitos de pessoas pobres e de crianças pobres que eu já assisti, inclusive com participação dos advogados P., A. M. e A. que até hoje me envergonham!

R. e P. poderiam ser atendidos pelo programa de Orientação e Apoio Sócio Familiar proposto pela Passos de Integração! Mereciam esse atendimento e ela, a mãe, poderia ficar com seus filhos, se tivesse recebido ajuda! Entretanto, a eles foi negada essa possibilidade: perdeu-se mais uma família de brasileiros: ele negro, ela índia e pobres e os três filhos, que, além de afastados do pai e da mãe, [com quem mantinham estreito vínculo], foram também separados um do outro.[2][3]
O fato 2 foi dividido em quatro fatos assim referidos: [a] Da Violência física, mental e psicológica praticada por abrigados contra abrigados dentro da instituição de abrigo e da inércia da Instituição” [b] “Da situação de privilégio do adolescente L.T.R.”; [c] “Do acesso ilimitado ao interior da instituição”; [d] “Das reclamações trazidas pelas mães quando ouvidas em juízo nos autos 005.08.0519XX-X[4],  tudo apurado em PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO PRELIMINAR [023/2008].

QUERO DECLARAR MEU REPÚDIO AO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO PRELIMINAR utilizado pelo MPSC. Verdadeiro instrumento de abuso por parte de alguns promotores de justiça. No meu caso tenho informações de que pessoas próximas a mim foram chamadas para “prestar declaração contra mim e contra a Casa da Criança do Brasil”. Neste caso o procedimento administrativo preliminar foi realizado com propósito espúrio.
Quando o juiz Renato Mastella recebeu o pedido do MPSC alegando esses dois fatos [1 e 2] e pedindo meu afastamento liminar,  afirmou que não eram fatos tão graves que justificassem afastar uma diretoria de uma ONG e negou o pedido.

O MPSC não aceitou essa decisão e recorreu ao TJSC através do agravo de instrumento 20090089254. O desembargador Domingos Paludo também não concedeu a liminar, sob o mesmo argumento e esse recurso [20090089254] e o processo [005080528001]  FICARAM PARADOS até que em agosto de 2011 o agravo foi levado a julgamento, o que somente aconteceu porque em 20/07/2011 eu noticiei ao juiz da vara da família UM FATO NOVO - que três meninos haviam ‘mexido’ nos órgãos sexuais de outro menino [todos abrigados na CASA] e o promotor M. V. R. usou dessa informação e com má fé processual[5], obteve a decisão que “em sede de liminar” me afastou da direção da CASA.
Algumas semanas antes desse fatídico e lamentável fato o promotor M. havia proposto que eu assinasse um “termo de ajustamento de conduta”, que eu recusei por também considerar um instrumento odioso, não somente pelo seu formato, mas por que significa que poderia estar acontecendo as coisas mais absurdas no abrigo ... mas desde que eu assinasse o tal termo, tudo estaria resolvido!  Simples assim: com a assinatura havia alguém para culpa e suas mãos poderiam ser lavadas.

Desde 2007 eu afrontei os posicionamentos dos promotores de justiça R. D., R. P. S., A. B. e finalmente M. V. J. em processos de destituição do poder familiar e/ou adoção.
Consequência disso é que de 2008 a 2011  - depois da negativa da liminar pelo Juiz Mastela e pelo Desembargador Paludo - ele, o promotor M. foi “guardando” diversos fatos, menores e maiores que aconteceram ao longo daqueles 4 anos, sobre os quais não iniciou novos procedimentos, como deveria.

Alguns desses fatos estão ligados à Casa do Adolescente[6], que na mesma época funcionou no mesmo terreno onde estava instalada a Casa da Criança. Nesse programa foram abrigados, entre outros, quatro adolescentes com perfil extremamente problemático: VANESSA, MARILENE, DIEGO e MAYCON[7]. Quem os mandou abrigar ali foi o juiz A. D. a pedido do promotor M. V. J. O terror que esses adolescentes provocaram na Casa do Adolescente foi visto e sentido pelos vizinhos como se ‘estivesse acontecendo na Casa da Criança’. As rádios noticiavam esses fatos falando da Casa da Criança, mas estavam acontecendo na Casa do Adolescente. Tudo isso também contribuiu para o dramático cenário que vivenciamos naquela época. Sobre esse fato não pudemos nos defender e a direção da Casa do Adolescente não foi processada.
Na mesma época a Casa abrigou D. e D., dois pré-adolescentes da Comarca de São João Batista/SC, se não me engano. Eram crianças que foram sistematicamente abusados sexualmente na cidade onde residiam; viviam pedindo esmolas na rua; tornaram-se agressivos e NINGUÉM, OU SEJA, NEM UM ABRIGO ACEITAVA RECEBÊ-LOS. A Casa da Criança aceitou. A realidade dos dois era dificílima. O menino D. evadia-se do abrigo e certa ocasião foi localizado pelo Conselho Tutelar -, que foi acionado pela CASA -, pedindo esmolas na 5ª avenida. Esse fato foi relatado no processo como uma “coisa que ocorria costumeiramente na CASA” e a respeito do que nada fazíamos. Sobre isso TAMBÉM não pudemos nos defender.

As outras citações a respeito do que disseram as crianças sobre práticas sexuais, - se é que se pode falar isso de crianças quando começam a descobrir a sexualidade -, precisam ser consideradas dentro de cada contexto. Ou seja, eram crianças que vinham de realidades onde a prática sexual era muito comum, principalmente por suas mães, que, aliás,  normalmente têm que sobreviver sozinhas com um, dois, três filhos [as vezes de homens diferentes que as abandonam[8]] que não as ajudam, sobrando-lhe somente a prostituição. Aquele bairro onde residem [a maioria era do próprio bairro dos municípios], é um foco de erotização tremendo – que também não poderia ser ignorado na avaliação desse caso, mas foi.
Tínhamos pequeno número de pessoas para cuidar das crianças, a maioria semialfabetizados e ganhando salário miserável. Simultaneamente a tudo isso nossa Diretoria pedia recursos para o Conselho Municipal, para o Poder Legislativo e para o próprio Poder Judiciário  e não recebia atendimento a esses pleitos.

Como é possível chamar de “estupro” o que uma criança de 4 anos faz com seu sexo? Que tipo de estupro essa criaturinha é capaz de praticar?
Não somente autoridades -  distantes da realidade -  pensam assim. Alguns dos funcionários que tínhamos na Casa pensavam assim. E por que? Como é que pode pessoas de tão diferentes extratos sociais pensarem do mesmo jeito a respeito da sexualidade em crianças? Porque na grande maioria das vezes aqueles funcionários e aquelas autoridades pensam e agem com conteúdo religioso  e não consegue dissociar o sexo do pecado.

Não passa pela cabeça deles que estavamos cuidando de crianças, a maioria pobre, mas nada mais do que crianças, que em certo momento a própria natureza se encarrega de provocar sensações diferentes que os levam a “investigar” que sensações diferentes são essas. Some-se isso a uma massificação do que é erótico [o tempo todo rádios e televisões ligadas sonorizando músicas [e cenas] de letras que estimulam o sexo a propósito de “vender” todo tipo de produto [produtos que os promotores de justiça, juízes, desembargadores também compram]].
Enfim, foi dentro desse quadro que aconteceram os episódios que foram levados ao judiciário através da ação 005080528001.

Todavia, UMA COISA eram todos esses fatos levados ao judiciário no ano de 2008 e OUTRA COISA foi o que motivou a desembargadora Sonia Schmitz a dar provimento àquele agravo 20090089254, ou seja, um fato ocorrido em 2011.
O QUE MOTIVOU A DESEMBARGADORA FORAM FATOS QUE SE REFERIAM A ACONTECIMENTOS NOVOS, que ocorreram em  2011. Deveriam basear um novo processo, com nova contestação e nova instrução. Todavia, o promotor de justiça M. V. R. apresentou esses fatos no agravo 20090089254 que já havia recebido as contra razões e no processo aqui na Comarca [005080528001], que também já havia recebido as alegações finais[9]e sobre os quais não foi oportunizado o contraditório e a ampla defesa, pois se tivessem permitido, teríamos mostrado o resultado dos inquéritos promovidos a pedido do próprio juiz da infância,  A. D., cuja conclusão foi de que aqueles fatos – que motivaram o meu afastamento – não ocorreram, por ação ou omissão, de minha parte e/ou dos funcionários.

Para sentir o tamanho do equívoco nos julgamentos feitos nesse processo, o Desembargador que julgou a apelação fez referência em seu voto sobre  o “depoimento” de uma mãe[10]. Esse “depoimento” não foi submetido ao crivo do contraditório; foi juntado no processo através de um ofício de outro promotor que tinha ouvido ela em outro processo; ela não tinha crianças abrigadas na Casa. Tratava-se de uma pessoa que passou a “me odiar” quando não dei guarida a sua ira contra um funcionário da Casa da Criança [Cristiano] que posteriormente o Poder Judiciário absolveu de uma acusação feita por ela[11]!
A decisão da 5ª Câmara do TJSC, aprovada em 26/06/2014 dando parcial provimento ao meu apelo e ao da Casa será agora objeto de outro recurso, que será dirigido ao STJ.

Depois disso, vou escrever outro livro mostrando toda essa insanidade.
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[1] O reordenamento dos serviços de acolhimento para crianças e adolescentes em nosso país constitui passo fundamental para se romper com a secular “cultura da institucionalização” de crianças e adolescentes, especialmente daquelas nascidas nas famílias mais pobres, e implementar práticas orientadas pelo paradigma do direito à convivência familiar e comunitária, respeitando o princípio da excepcionalidade e provisoriedade do afastamento do convívio familiar. [Levantamento Nacional das Crianças e Adolescentes em serviço de acolhimento, Hucitec Ed. São Paulo, 2013, pág. 20].
[2] Em 23/02/2007 a assistente social Elizete da Rosa, da Casa da Criança do Brasil, apresentou seu relatório (fls. 53), onde consta: “Relatou que sua mãe quer que ela repita o mesmo, entregando seus filhos para uma instituição, como fez com ela e seus irmãos quando os mesmos eram crianças. Perguntei se ela queria fazer o mesmo com seus filhos, ela respondeu que não, mas que precisa que alguém a ajude porque sua mãe não vai mover um dedo para lhe ajudar.” (sic. Fls. 53).
 
[3] Art. 23 – ECA - A falta ou a carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou a suspensão do pátrio poder.
[4] Deste processo a CASA e EU não participamos!
[5] Afirmo que agiu com má fé porque “enxertou” fatos novos dentro dos memoriais que apresentou no agravo e no processo. A Desembargadora e o Juiz DEVERIAM DAR VISTA DESSA PEÇA PARA A CASA E PARA MIM. Não fizeram isso porque foram induzidos em erro pelo promotor, pois naqueles memoriais não havia documentos anexados. Ora, os documentos sobre fatos novos foram escaneados pelo promotor e enxertados dentro da peça.
[6] Outra ONG não dirigida por mim
[7] Este último foi assassinado
[8] Há um programa do TJSC denominado ‘PAI LEGAL’. Vejam só: o sujeito engravida a mulher, abandona-a; não ajuda na criação do filho e daí vem o TJSC chamando de PAI LEGAL esse sujeito, só porque a DESTEMPO ele “DEU” o sobrenome ao filho !!! quanto equívoco.
[9] A Lei diz claramente: APÓS AS ALEGAÇÕES FINAIS O QUE DEVE ACONTECER É A SENTENÇA. SE DOCUMENTOS NOVOS FOREM JUNTADOS, A OUTRA PARTE DEVE NECESSARIAMENTE SER INTIMADA PARA DELES SE MANIFESTAR. A justiça da infância de BC não praticou essa regra nesse processo. A mesma coisa aconteceu na 5ª câmara de direito civil do TJSC. Por quê?
[10] C. L.
[11] No dia 23/06/2014 o TJSC manteve a absolvição de Cristiano!!!